sábado, 8 de setembro de 2012

A morte ensombra de novo as montanhas do Virunga. Rebeldes avançam sobre o Parque Nacional.



Texto: Manolo
Fotos: Glória


As várias facções de rebeldes acantonadas na floresta do Virunga, entre a República do Congo e o Ruanda, voltaram a pegar nas armas em desacordo com o que dizem ser uma trapaça, as eleições em que Joseph Kabila saiu mais uma vez vitorioso.
Recorde-se que Kabila mudou as regras do jogo pouco antes do acto eleitoral, anulando o sistema de duas voltas e a possibilidade de estabelecimento de coligações para a segunda volta, com a justificação de se poupar dinheiro. A oposição tentou impedir, sem êxito, este truque de última hora, considerando-o inconstitucional.
O povo da região da Goma enfrenta assim, mais uma vez, e a última foi em 2008, o terror da guerra civil que alastra endemicamente na região, dizimando centenas de civis, homens, mulheres e crianças.



No Parque do Virunga existem cerca de 700 gorilas protegidos por um comando de Rangers, soldados que arriscam a vida para proteger o Parque a fim de se evitar a extinção daqueles mamíferos primatas.
Nos últimos anos morreram cerca de 250 destes homens, assassinados pelos rebeldes e pelos caçadores furtivos. Entre estas vítimas estão, inclusivamente, alguns dos Rangers que nos acompanharam até ao vulcão do Niragongo e aos Gorilas do Virunga (ver a reportagem nas «Revista 4x4», n.os 53 e 54).
Depois de alguns dias juntos ficámos amigos, fomos convidados a ir às suas casas, conhecemos as suas famílias, brincámos com as suas crianças e sentimos as ansiedades e as necessidades destes pequenos heróis. Não é excessivo classificá-los assim, pois por cerca de 40 euros mensais, quando os recebem, arriscam a vida em prol de uma causa que, estranhamente, proporciona milhões de euros a pseudo-organizações defensoras dos gorilas apoiadas pela União Europeia, entre outros patrocinadores.


Katcho, Karume, Mandembo, Karmeche foram alguns dos amigos que nos acompanharam durante vários dias e que desapareceram para sempre do nosso convívio. Karume era um fervoroso admirador de Cristiano Ronaldo, um pisteiro excepcional que me transmitiu muitos conhecimentos sobre como se deve andar numa floresta.
Presto aqui a minha homenagem a estes amigos que morreram por uma causa justa, tão silenciada ou hipocritamente tratada no mundo ocidental.

                                           Karume era um fervoroso admirador de Cristiano Ronaldo

Devido a estas movimentações de rebeldes a direcção do Parque resolveu evacuar todas as famílias dos Rangers para um campo de refugiados construído para o efeito. Neste momento estão a necessitar de fundos para assegurar a protecção das mulheres e das crianças e assegurar um nível de saneamento que impeça surtos de cólera e de outras doenças contagiosas igualmente mortais.





Relembrando um pouco a história do conflito: desde o genocídio de 1994 no Ruanda que a região tem sido atormentada pela guerra civil. Abençoada por infinitos recursos naturais, desde minerais a depósitos de combustíveis fósseis, a área em torno de Virunga tem sido alvo de empresários sem escrúpulos.
A miríade de grupos armados que operam dentro e em redor do Virunga desempenha um papel importante no fornecimento de protecção para as empresas privadas que exploram as riquezas nas montanhas.
Em Abril de 2012, a guerra recomeçou entre um movimento rebelde, o M23, e as forças governamentais. Em Maio e Junho atingiu o sector dos gorilas, com ofensivas de artilharia pesada que se abateu sobre toda a região.
Os Rangers do Virunga permaneceram no Parque durante todo este período e continuaram a desenvolver o seu trabalho, apesar de os laços familiares terem ficado interrompidos e de todo o sofrimento no dia-a-dia. 

O Virunga precisa de nós


 É urgente que divulguemos o sofrimento destas pessoas e dos próprios animais. Através das redes sociais podemos construir uma vasta plataforma para ajudar os guardas do Parque do Virunga. Trata-se de homens que estão dispostos a proteger os animais por amor, para evitar a extinção de uma espécie que, desaparecendo da face da Terra, a deixa muito mais pobre.
O apelo que eu faço é que ajudem estes guardas a protegerem os gorilas. Divulguem as atrocidades que estão a fazer a estes e a outros animais. Nesta região, por exemplo, praticamente já não existem elefantes.
Deixo, portanto, um apelo para que a perda de quase 250 vidas humanas não tenha sido em vão.


Atenção: O vídeo contém cenas violentas que podem chocar pessoas mais sensíveis. 


«Há, sem dúvida, muitos riscos associados a este trabalho, mas a nossa preocupação são os gorilas. Essa é a razão para estarmos aqui», disse Innocent Mburanumwe, chefe dos Rangers.